terça-feira, 29 de julho de 2014

Entrelinhas - Pra lá desse quintal

Pra lá desse quintal sempre houve uma noite infinita que, agora que o transpôs, não sabia se deveria. Talvez fosse melhor imaginá-la pelo rádio ao debruçar-se sobre a mesa a ouvir aquela música e deixar-se fazer dela – a noite – o que as suas lágrimas sugerissem. Mas a curiosidade o abateu como estrelas cadentes a viajarem em excessos. Era evidente a sua felicidade na simples-cidade em que vivia: meiga, pequena, pacata protegida dos adereços que tornam cheios os nossos pensamentos. E quão mais confortável era a vida pouca neste quintal vazio que o tempo ainda não preenchera...  Tudo era tão cheio de nada em sua volta que a falta, além de não se fazer presente, apresentava-se como possibilidades. Um banho quente em noite fria era um bálsamo de abundância; o que dizer da velha bicicleta que o ajudava a vencer a longa distância entre a casa e a escola e ainda emprestava-lhe a suave carícia do vento? Mas o menino cresceu... E o quintal não mais lhe cabia. Não se arrependia de ter desejado o infinito, mas de tê-lo deixado ser ilusão...

sexta-feira, 25 de julho de 2014

Entrelinhas - A "cadeiraerrante"


Este entrelinhas foi um pedido de uma pessoa incrível que faz um trabalho maravilhoso - Marta Alencar - Foi ela quem me apresentou a Tina, a razão dessas palavras. Vocês podem conhecer mais sobre ela no blog www.tinadescolada.wordpress.com. Diz a Marta que ganhou um presente... Eu fico pensando ao olhar as imagens da Tina: Foi ela que ganhou um presente ou fui eu?...

“Sou eu. Sou eu que ponho perfume nas flores, sou eu que alimento o sopro dos ventos, que tinjo de luz o negrume da noite a sustentar-me em asas descoladas”.
Valentina acordou com estas palavras a fazerem versos em sua mente. Estranhou o fato de não ser alguém a lhe dizer isso em sonho que já não lembrava, mas de ser o próprio sonho que a despertava. Aquele não seria mais um dia comum... No vazio de sua existência, onde insistiam em mantê-la em uma viagem permanente que a distanciava cada vez mais de onde queria estar, perfilava a fronteira entre a sombra e o esplendor do sol que a separava da imobilidade.
Valentina, valente, tinha no nome a fonte: a coragem e a força de emplumar-se, como aves, a liberdade de sua alma. E daí que vivia em uma cadeira de rodas? Acaso não existia? Não havia lugar aonde não pudesse ir nem havia nada que não pudesse fazer. Levantou-se, se preparou num esmero de namorada e linda, como nunca havia deixado de ser, mirou-se no espelho para, antes de chamar a todos e anunciar sua nova presença, chamar a si mesma. Horas achadas ficou remirando seu rosto e seu corpo enxergando além deles. Descobria-se... Valentina virou Tina, descolada do que lhe prendia. 
Surgia ali Tina Descolada, e agora com uma razão de vida: ser uma “cadeiraerrante” sem limites a viajar

pelo mundo dos sonhos e das possibilidades, descolando outras Tinas para a liberdade e construir rampas de acesso ao coração das pessoas no lugar onde antes existiam escadas. Agora sim, podia chamar os outros. Estava na hora de voar...