Apresentou-se ao marido de manhã com uma
decisão tomada:
_ Quero me descasar com você.
A sentença seca e inesperada fez com que
Eduardo fingisse demorar-se numa risada incrédula, porém nervosa. Tal atitude
era a tentativa de defender-se daqueles olhos órfãos de carinho que o miravam
profunda e serenamente.
_ O que está querendo dizer? – indagou
ainda na retaguarda já imaginando dissabores.
_ O que você ouviu. Quero me descasar.
Num instante se lembrou do que vinha
acontecendo, ou melhor, do que não vinha acontecendo em suas vidas, do tanto
que estavam distantes – quase dois estranhos dentro de casa e fora dela – e
sabia que isso, um dia, pediria enfretamento. Mas assim, sem avisar? Logo o ego-semprismo compareceu à inesperada
reunião trazendo o costumeiro ataque e, sem esperar ou sequer tentar mudar os
óculos, lançou a pergunta:
_ Existe outra pessoa?
_ Sim.
O Chão parecia ter sido tirado de seus
pés. Seu corpo todo tremeu, seus olhos embaçaram e, sentando para disfarçar o
indisfarçável, quis saber quem era. A esposa, sem contra-ataques, mantendo a
serenidade no rosto e até um carinho nos olhos, disse pausadamente como se
estivesse lendo uma missiva: que era alguém que a entendia, que era capaz de
adivinhar seus pensamentos e desejos antes mesmo de os terem, que entendia que
nada estava garantido e que, por isso, a enxergava e a cuidava como uma
preciosidade que não queria perder, ocupando, assim, o seu lugar em seu
coração; uma pessoa, enfim, que a fazia sentir o lado prazeroso e leve do
encontro.
Parecia não acreditar no que ouvia. Os
sentimentos se misturavam entre a cólera e o desespero. Num impulso, bateu com
os punhos na cama gritando para aliviar o que o explodia:
_ O nome! Diga-me o nome!
A mulher, já com as lágrimas nos olhos
que insistiam em demonstrar afetos, respondeu ao marido deixando-se chorar:
_ Eduardo.
Ao dizer o seu nome, tirou de baixo do
travesseiro uma folhinha de calendário e o entregou. Nela estava a data bem
marcada de vermelho: 12 de junho, dia dos namorados...
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